Sobre a verdade

Uma vez um jovem médium iniciante, num desses tantos terreiros de luz, perguntou a um pai velho o que era, afinal de contas, a verdade.
O velho, fumando seu cachimbo, não respondeu. Olhou para o jovem e pediu que ele se sentasse ao seu lado por alguns momentos.
Sem entender o que estava acontecendo o jovem ressabiado pegou um banquinho e sentou-se ao lado do guia muito mais em sinal de respeito do que por vontade própria.
Era um dia frio e de chuva forte, as pessoas amontoaram-se num cantinho do terreiro, deixando outros lugares vazios do outro lado.

Então o velho apontou para as pessoas e indagou ao jovem:

- O que você está vendo ali meu filho?

Eis que o mancebo respondeu:

- Estou vendo um monte de pessoas se amontoando para fugir da chuva forte e não se molhar.

O velho ouviu, virou-se para o outro lado e chamou um guia que passava perto e fez a mesma pergunta:

- Caro amigo, o que você vê ali naquele canto?

Eis que o guia respondeu:

- Eu vejo pessoas com frio querendo se aquecer.

Virou-se para o jovem e indagou se tinha ouvido a resposta tendo o mesmo acenado com a cabeça positivamente. O velho então chamou um cambono que estava perto e perguntou o que estava acontecendo ali. Eis que o cambono respondeu:

- Ah, as pessoas estão ali porque os assentos naquele canto são mais confortáveis.

O velho agradeceu e voltou-se para o jovem:

- Percebeu meu filho. Isso é a verdade.

O jovem franziu sua testa e fez de sua expressão facial uma manifestação clara de confusão e dúvida, e o velho continuou:

- A verdade como vocês a entendem é uma manifestação do pensamento humano, da vontade, da percepção, dos sentimentos, dos conceitos e preconceitos de cada um, tal como o amor, o ódio, o medo e até a fé. O fato é que as pessoas estão amontoadas naquele canto. Os motivos pelos quais elas estão ali vão da cabeça de cada um. Até para aquelas pessoas que estão naquele cantinho os motivos não são os mesmos e estarão elas erradas ou mentindo? Se uma pessoa sente frio, a outra não quer se molhar e a outra só que se sentar num lugar mais confortável, quem é que tem razão, quem é a dona da verdade ?

E o jovem respondeu:

- Todas elas.

E o velho rindo continuou:

- Isso é um ensinamento para a vida real (encarnada) e para vida espiritual. Não existem verdades absolutas neste plano e a nossa função como guias não é impor ou ditar uma verdade incontestável, mas tão-somente mostrar aquela verdade que a pessoa necessita naquele momento e respeitar todas as outras que dali podem surgir. Nem sempre é o que se quer ver ou ouvir, nem sempre é o que se deveria ver ou ouvir, mas com certeza é aquela que a pessoa mais precisava naquele momento. E no final meu filho, o importante não é aceitar ou recusar a verdade dos outros, mas procurar entendê-la e respeitá-la.

O jovem emocionado com a profundidade do ensinamento que ali recebera agradeceu ao pai velho e voltou-se para seus trabalhos com afinco.

Mensagem Anônima

Ao acordar hoje de manhã me deparei com o comentário que reproduzo aqui na íntegra:

"Uma pena como a religião é disseminada... Acho que deveríamos respeitar uma religião que tem uma cultura tão bonita... sinceramente... quando não conhecemos um assunto, ou quando não temos capacidade de assumir tais compromissos e cargos religiosos, é melhor sermos humildes e assumir as nossas verdades... nunca fui contra o cantinho, mas contra a forma que a coisa é conduzida... Animismo é diferente de incorporação, culto religioso é diferente de encenação... acho que uma cultura que diz respeitar a opinião e o próximo, não deveria ter seu blog com comentários monitorados... Medo da verdade? realmente talvez seja conveniente para alguém se alimentar da fé de leigos...

Postado por Anônimo no blog C.E.C.V.O.A. em 13 de Março de 2008 18:37
"

De início gostaria de dizer que o comentário não causou nenhuma surpresa, ao contrário, vai me auxiliar a dar algumas explicações necessárias.

A moderação não existia desde o início do blog que é muito recente. O problema é que tal como existem pessoas sérias, honestas e sinceras, também existem aquelas pessoas mentirosas, covardes e sórdidas que se aproveitam do anonimato para propagar ofensas ou dizer inverdades que visam simplesmente depreciar, denegrir ou atingir as pessoas. Portanto, para que seja mantido o equilíbrio entre o respeito ao próximo e a opinião pessoal de cada um, faz-se necessário continuar ocorrendo a moderação.

Sobre o conteúdo da sua mensagem concordo apenas com um argumento: que uma cultura tem que respeitar a opinião e o próximo, e assim tem sido feito.

Você tem todo o direito de achar que o "Cantinho" é conduzido de forma errada, ou que ocorre animismo ou encenação, mas tenho que te lembrar que essa é somente uma opinião, pessoal e anônima, e como tal deve ser respeitada.

Opinar ou achar é sempre válido, mas na maioria das vezes desprovido de conhecimento ou aprofundamento dos fatos. Se você se preocupou em ler o blog inteiro ou a história da "Primeira Gira" do Cantinho, deve ter percebido que na inauguração uma pessoa (infelizmente ou felizmente) foi convidada a se retirar porque estava fingindo ter uma incorporação, e tal fato já tinha sido esclarecido pelo Vovô Oscar aos presentes no início dos trabalhos algumas horas antes de acontecer.

A falta de incorporação ou incorporação fingida (ou animismo, já que você gosta assim) não é nem de longe o pior dos problemas de um terreiro e nem o único.

Creio que médiuns incorporantes, consulentes, com entidades firmes, mas com pensamentos e sentimentos voltados para fazer o bem somente a si mesmos e o mal para os outros, são exemplos de problemas piores. Estou cansado de ver sessões pesadas e cansativas para desfazer trabalhos feitos por médiuns que se auto-intitulam umbandistas, vestem branco, e dizem que fazem a caridade e o bem, mas que não perdem uma oportunidade, no terreiro ou fora dele, de fazer intrigas, difamar e causar males de todos os tipos aos seus irmãos.

No fundo essas pessoas desvirtuadas utilizam a religião ou a espiritualidade como formas de extravasar alguma frustração ou decepção pessoal, profissional ou amorosa ou de superar algum trauma de infância. Esses médiuns precisam de tanta ajuda (ou mais) do que os assistentes, porém, precisam reconhecer por si mesmos os erros que estão cometendo para poderem ser ajudados.

Nessas horas eu tento me orientar pelos exemplos do "Mestre Oxalá", que mesmo pregado e martirizado na cruz, numa demonstração divina de caridade, mostrou a luz a um ladrão assassino que naquela hora pedia perdão.

Isso sim é exemplo para a nossa linda umbanda.

E apesar do "Cantinho" ser uma casa recente já estamos conseguindo frutos do nosso trabalho, sendo agraciados com declarações de respeito de outras casas espirituais, conhecidas e contemporâneas não só na umbanda como também em outras religiões.

De qualquer forma, sr.(a) Anônimo(a), você está convidado(a) a participar das giras do "Cantinho" e a expressar sua opinião sem medo, pois tanto os médiuns como as entidades estão sempre aprendendo uns com os outros. E não precisa se preocupar em discordar porque você pode ter certeza que nada será feito que não a caridade (com honestidade) e o bem (ainda que para desfazer o mal).

Que Oxalá abençoe você e ilumine seus caminhos.

Abraços,

Guilherme


P.S.: Na próxima postagem seguem algumas palavras sobre a "verdade".